terça-feira, 8 de outubro de 2013

Alice

Tímida. Se ela pudesse escolher algo que a descreveria a palavra seria essa. Estava apaixonada, mas tinha para ela que um homem como aquele preferia as mulheres mais espontâneas, daquelas que chegam nos ambientes já dizendo o que pensam, brincando e hipnotizando as pessoas ao redor. Ela sempre admirou essas mulheres que, independente da beleza ou posição, tinham um charme arrebatador vindo provavelmente da autoconfiança e de um certo sentimento de amparo. Coisas que ela mesma nunca teve. Sabia.

Sentia-se invisível. Era certamente um tipo que ninguém reparava, aquela colega de classe que o nome fugia ou aquela moça do trabalho um pouco antipática e muito quieta. Sabia que não era feia e considerava-se até bonita quando colocava uma roupa adequada no seu corpo curvilíneo, uma que escondesse aquela barriguinha indesejada saliente, e também tinha um belo sorriso embora de nada adiantava isso ou seu esforço em frente ao espelho, achava-se desinteressante. Não conseguia expressar-se bem, tinha vergonha de expor suas opiniões mesmo entre conhecidos e ficava vermelha, gaga e sem reação caso recebesse qualquer elogio de um homem. E se fosse um elogio dele poderia até vomitar.

Gostava de ir direto pra casa depois do trabalho, estava lendo um livro ótimo que a esperava no criado mudo ao lado da confortável cama de casal com a qual havia se presenteado recentemente e na qual nada poderia afetá-la, não teria que correr o risco de entrar em uma conversa que não saberia continuar ou de ficar deslocada, como costumava ficar em diversas situações devido a evidente falta de habilidades sociais e a aparente invisibilidade. Mas resolveu ir ao happy hour apenas porque algo dentro dela fazia com que se sentisse mais viva apenas por estar no mesmo ambiente que ele. E sentia-se patética por isso.

Foi ao toalete feminino com a necessaire, retocou a maquiagem, penteou o cabelo, lavou e passou creme nas mãos. Chateou-se por não ter um perfume na bolsa e por ter vestido naquela manhã a blusa preta e surrada que via pelo espelho, mas como iria saber que seria convidada para o happy hour? E também não importava, ele não a enxergaria de qualquer forma, ela queria apenas observá-lo de longe para distrair-se um pouco. Assim que saiu do banheiro esbarrou em Moreno, um colega do departamento de Recursos Humanos, que a chamou “Ei, você não vem?”. Disse que ia e foram juntos conversando sobre amenidades. Nada que ela estivesse prestando atenção.

Iam caminhando, o bar era logo ali na esquina. Ela, assim que chegou na rua acendeu um cigarro e assim que deu a primeira tragada sentiu-se ótima. Depois mudou de ideia quanto ao programa, talvez porque não quisesse que nada estragasse o seu bem estar e o barulho, a bebida e as conversas enfadonhas acabariam com o seu recém adquirido bom humor, tanto quanto ser completamente ignorada por ele. Disse a Moreno que não podia ir ao bar, desculpou-se sem necessidade e mentiu que havia acabado de lembrar de um compromisso, um jantar com uma amiga já marcado, teria que ir embora. Foi.

 No caminho de volta, enquanto dirigia, ligou para Leila afim de saber se a amiga e companheira de apartamento de fato gostaria de jantar com ela em algum restaurante bacana, poderiam beber umas cervejas para brindar a noite quente, mas Leila explicou que estava presa no trabalho como sempre. Então, ainda sentindo-se bem, tomou o rumo da sua casa escutando seu velho CD do Cazuza, no caminho passou no supermercado e comprou  uma lasanha congelada, uma salada de frutas já pronta e uma garrafa de vinho.

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